Os 960 réis do Brasil é uma das séries de moedas mais incríveis e fascinantes da numismática da América do Sul. Carinhosamente chamados de patacões, eles possuem uma história e características que, na minha opinião, os tornam as moedas mais sexys da numismática.
Descubra neste post porquê essas moedas despertam tanta admiração dos numismatas e a história dos patacões.
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- Como surgiram os patacões
- 1º tipo: Os 960 réis coloniais
- 2º tipo: os 960 réis do Reino Unido
- 3º tipo: os 960 réis do Brasil independente
- Porque outras moedas foram usadas como base para os 960 réis?
- A raridade dos 960 réis
Como surgiram os patacões
Com cunhagem iniciada em 1810, os 960 réis diferem ligeiramente de outras moedas denominadas "Crown-Size" (moedas com diâmetro aproximado de 38mm) do início do século XIX por vários fatores.
A maioria das combinações de datas e letras monetárias de 960 réis podem ser encontradas com facilidade, uma vez que muitos deles foram cunhados em grandes quantidades, mas são as moedas que foram utilizadas como base do recunho dos 960 réis que os tornam uma das moedas mais interessantes da numismática.
As Casas da Moeda do Brasil usavam qualquer moeda no diâmetro de coroas que pudessem encontrar e obter a um valor mais baixo, independentemente de onde vinham.
Enquanto a maioria dos 960 réis foram cunhados sobre as moedas de 8 reales espanhóis (uma das moedas comerciais mais comuns no século XIX), muitos outros tipos de moedas conhecidas foram utilizados como base das cunhagens e, sem dúvida, muitas outras ainda serão descobertas.
Antes das Casas da Moeda do Brasil cunharem moedas com denominação de 960 réis, os 8 reales recebiam contramarcas pequenas para demarcar a mudança do valor de 8 reales para 960 réis.
Na época o Brasil era colônia de Portugal e em 1807 a corte portuguesa juntamente com a família real, vários nobres e altos funcionários (aproximadamente 10 mil pessoas) mudaram-se para o Brasil devido a um bloqueio e invasão pela França.
Os portugueses adotaram essa interessante estratégia para se manterem fiéis ao Reino Unido, cujo comércio era extremamente importante para a colônia portuguesa.
A família real ficaria em Portugal por 15 anos, criando uma situação curiosa: o grande império colonial de Portugal seria governado não da pátria, mas de uma de suas colônias.
Em 1815, o Reino Unido de Portugal, Brasil e o Algarve foi criado, colocando essencialmente o Brasil no mesmo patamar político de Portugal.
Normalmente se presume que as contramarcas mencionadas acima eram uma medida temporária criada para facilitar as novas despesas de hospedagem da família real e sua comitiva no Brasil.
Em 20 de novembro de 1809 uma nova moeda foi criada e continuou sendo produzida até poucos anos depois que o Brasil conquistou sua independência de Portugal em 1822.
A maioria das peças foram cunhadas na Casa da Moeda da Bahia (até 1826) e do Rio de Janeiro (até 1827), com algumas exceções que falaremos mais adiante. Uma pequena quantidade de peças foram cunhadas em Minas Gerais (em 1810 e 1816).
Foram utilizados três tipos de designs diferentes: os 960 réis coloniais, os 960 réis do reino unido e os 960 réis do Brasil independente.
1º tipo: os 960 réis da Colônia
O primeiro tipo de 960 réis foi o colonial, que possui coroa portuguesa acima do brasão, ladeado pela data, dístico do valor facial e três flores pequenas.
Em torno da coroa, a legenda: JOANNES. D. G. PORT. P. REGENS. ET. BRAS. D, uma abreviação para João, pela Graça de Deus, Príncipe Regente de Portugal e defensor do Brasil.
A parte central do reverso possui o que é chamado de esfera armilar colocada sobre uma grande cruz com uma faixa diagonal, a qual recebe a marca de cunhagem.
No rebordo da moeda possui a legenda SUBQ / SIGN / NATA / STAB, que é traduzida literalmente como Nascido sob este símbolo e permanecerá nele.
Pesquisadores numismatas ainda não concordam que esta é a exata interpretação da legenda do reverso, então a discussão continua.
2º tipo: os 960 réis do Reino Unido
O segundo tipo de 960 réis é conhecido como o tipo do reino unido e já não possui o brasão Português sob a coroa.
O brasão do anverso foi substituído pelo dístico do valor facial com apenas o 960, a data e a marca de cunhagem, rodeados por uma grinalda de ramos de café.
A legenda do anverso também mudou: JOANNES. VI. D. G. PORT. BRAS. ET. ALG. REX que pode ser traduzida para João VI, pela Graça de Deus, Rei de Portugal, Brasil e Algarve.
O reverso mantém a esfera armilar, mas foi colocado sobre ela o brasão Português que antes ficava no anverso. A legenda do rebordo do reverso, em torno da esfera, continua a mesma.
Este tipo foi cunhado de 1818 a 1822 na casa da moeda da Bahia e de 1819 a 1822 na Cada da Moeda do Rio de Janeiro.
3º tipo: os 960 réis do Brasil Independente
As moedas do último tipo de 960 réis foram cunhadas de 1823 a 1826, depois que o Brasil conquistou a sua independência.
Ele é caracterizado por um grande "960" central no anverso, ladeado por cruzes e flores.
A data e a marca de cunhagem estão abaixo de uma coroa de flores de tulipas e ao seu redor a legenda PETRUS. I. D. G. CONST. IMP. PERP. BRAS. DEF, que pode ser traduzida para Pedro I, pela Graça de Deus, Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil.
O reverso contém o novo brasão brasileiro e a legenda IN HOC SIGNO VINCES, que pode ser traduzida para "Sobre este símbolo vencerás".
Porque outras moedas foram usadas como base para os 960 réis?
É bom ressaltar que o motivo principal para usar outras moedas como base para os 960 réis foi o lucro.
Uma moeda de 8 reales valia aproximadamente 750 réis no Brasil, então, cada vez que um 960 réis era cunhado sobre 8 reales, o governo português obtinha um lucro instantâneo de 21,875%.
Isso ajudou a garantir que os 960 réis brasileiros não fossem exportados em larga escala para outros países e que circulassem exclusivamente no Brasil.
As moedas foram compradas de várias fontes, incluindo visitantes de outros países, motivo pela qual existem tantas variantes conhecidas de moeda base e outras que são extremamente raras e até únicas.
As casas da moeda do Brasil compravam todas moedas que eram oferecidas na sua porta, afinal, como já dito, cunhar 960 réis era lucrativo para Portugal.
Quando os 960 réis eram recunhados pelas casas da moeda do Brasil, as moedas base eram aquecidas para receber a cunhagem da nova moeda, mas algumas não eram completamente derretidas, fato que justifica que a maioria das moedas de 960 réis, alguns detalhes das moedas base originais permanecem visíveis.
A raridade dos 960 réis
Em algumas moedas de 960 a data e a letra da casa monetária da moeda base são mais visíveis, enquanto em outras apenas algumas partes podem ser vistas, por vezes exibindo apenas características suficientes para identificar a moeda base.
Os 960 réis que possuem a data e a letra da casa monetária visíveis valem mais que outros da mesma data que não há essas marcas remanescentes.
Quando é possível identificar que a moeda base do 960 réis é um subtipo raro, não é necessário que a data e a letra da casa monetária estejam visíveis para a moeda tornar-se mais rara e valiosa.
Conforme dito anteriormente, a maioria dos 960 réis foram cunhados sobre moedas coloniais espanholas de 8 reales provenientes de todos os países da América Central e do Sul.
A maioria das moedas são da década de 1810 e 1820, mas também são conhecidas algumas de datas anteriores, incluindo o 8 reales colunário, embora em números muito mais baixos, já que estas não foram cunhados por várias décadas.
Aproximadamente 22,5 milhões de 960 réis foram cunhados de 1810 a 1827 e, embora a emissão total exata não seja conhecida, é provável que aproximadamente 80% a 90% deles tenham sido cunhados sobre 8 reales espanhóis com efigie.
Além das emissões em 8 reales, outros tipos de moedas foram usados pelas casas da moeda brasileiras para cunhagem de 960 réis.
Outras moedas espanholas comumente encontradas como base para os 960 réis são as de países vizinhos brasileiros como a Argentina e Peru.
Os subtipos mais raros foram cunhados em várias moedas de todo o mundo, algumas das quais produziram apenas uma única peça conhecida, enquanto outras têm apenas alguns exemplos confirmados.
Isso provavelmente ocorreu quando algum marinheiro embarcou com uma moeda de seu país no seu bolso ou quando algum turista veio visitar o Brasil com alguma moeda e estas acabaram em alguma Casa da Moeda do Brasil.
Estes casos são muito apreciados por grandes colecionadores e por especialistas numismatas por sua raridade. Vejamos alguns exemplos:
- Inglaterra, Coroa de William III de 1696: moeda visitante mais antiga conhecida, classificada como única;
- Banco da Inglaterra, dollar de 1804: foi convertido em um 8 reales espanhol. Duas peças conhecidas;
- Índia, Madras 2 Rúpias: foi convertido em um 8 reales espanhol. Peça única, da coleção do Banco Central do Brasil.
- Áustria, Thaler de 1780 de Maria Theresa: três peças conhecidas;
- Holanda, ducados de prata do início do século 19: três peças conhecidas;
- Estados Unidos, dólar de busto do final do século 18: quatro peças conhecidas com vários outros relatos, mas não confirmados.
As moedas de 960 réis cunhadas sobre o dólar de busto não são as mais raras dos subtipos, mas são as mais apreciadas por colecionadores americanos.
Alguns exemplares foram vendidos nos últimos anos, incluindo um 960 réis de 1823-R (Casa da Moeda do Rio de Janeiro) cunhado sobre um dólar de busto, classificado como MS-62 (flor de cunho) pela NGC, vendido por US$ 23.500 em janeiro de 2013.
Outros valores foram encontrados, como US$ 37.375 por um 960 réis de 1810-M (Casa da Moeda de Vila Rica) com reverso invertido, classificado como XF-45 (Soberba).
Há ainda um caso de um 960 réis de 1809 e classificado como PF-62 (prova) pela NCG que foi vendida por US$ 30.550.
No entanto, nem todos os exemplares de 960 réis são tão raros e tão caros. Por aproximadamente R$ 300,00 a R$ 500,00 um colecionador consegue adquirir um 960 réis em ótimo estado de conservação (MBC ou SOB), com detalhes visíveis e pátina original.
Os preços sobem a partir deste patamar quando o 960 réis apresenta em bom estado a data completa e/ou símbolo monetário da moeda base.
Os 960 réis que possuem data de cunhagem idêntico a data de cunhagem da moeda base também são muito valorizados e devem ter alta procura futuramente.
Alguns 960 réis são conhecidos por terem sido cunhados por cunhos "virgens", que eram lisos, novos cunhos das casas da moeda brasileiras. Esses são extremamente raros e não há ocorrências em todas as datas.
Se um 960 réis apresenta o campo muito liso, sem detalhes de uma moeda base visível, é melhor usar uma lupa de alta ampliação para estudá-la e encontrar algum detalhe da moeda base com a lupa.
Há uma pequena quantidade de 960 réis cunhadas pela Casa da Moeda do Rio de Janeiro com as datas de 1832, 1833 e 1834. Há estimativas de que a quantidade total cunhada destas moedas seja de aproximadamente 3.193, sendo destas apenas 154 de 1834 (conforme o Livro das Moedas do Brasil 14ª edição, página 186).
É bom ressaltar que como não havia tanto rigor legal de controle da quantidade de moedas cunhadas, qualquer estimativa atual está sujeita a questionamentos, principalmente no que diz respeito a espécimes sobreviventes, ou seja, aqueles que estão em estado de conservação aceitável para coleções.
Lembre-se ainda que várias moedas de prata foram vendidas a quilo para indústrias de talheres, joias e de fabricação de outros objetos, o que impossibilita um censo preciso de espécimes sobreviventes.
São três moedas de 960 réis extremamente raras que valem de R$ 7.600,00 (1832 R MBC) a 95 mil reais (1834 R FC). Avaliação pelo Livro das Moedas do Brasil 14ª edição.
Embora essas moedas usem o mesmo design dos 960 réis discutidos neste artigo, elas não foram cunhadas sobre outras moedas, mas em placas de prata normais e talvez devem ser consideradas uma série a parte.
A raridade das mesmas, no entanto, impede que muitos colecionadores as tenham, mesmo que seja um único exemplar de data.
Fontes:
- Cuhay, George S. (Editor). Standard Catalog of World Coins 1801-1900. 7th Edition. 2012
- Hamilton, Peter F. A Study of of Brasil 960 Reis Coinage. 1996
- Levy, David André. The 960 réis Overstrikes. 2nd Edition. 2009