Moedas Brasileiras da colônia
As primeiras moedas a circular no Brasil foram as mesmas correntes em Portugal na época dos descobrimentos, que vieram trazidas pelos descobridores e posteriormente pelos mercadores e pelos colonos que aqui se estabeleceram.
Alguns exemplos dessas moedas, por reinado:
Reinado | Ouro | Prata | Bilhão |
---|---|---|---|
D. Afonso V | Escudo e Cruzado | Real Grosso e Chinfrim | Espadim e Real Branco |
D. João II | Justo | Cinquinho | — |
D. Manoel I | Português (4000 Réis) | Tostão (100 Réis) e Índio | — |
D. João III | Português (4000 Réis) e São Vicente (1000 Réis) |
Real Português dobrado (80 Réis) | — |
É importante ressaltar que não só durante os primeiros duzentos anos da colonização, mas também após a instalação e funcionamento da Casa da Moeda no Brasil e durante toda a vigência do Primeiro Sistema Monetário a situação da circulação pecuniária na colônia foi da mais absoluta precariedade, servindo como moeda também mercadorias como panos de algodão, açúcar e fumo, por total falta de dinheiro circulante.
Em 1580, com a unificação das coroas ibéricas foi introduzida na circulação colonial a moeda de prata castelhana, que teve imediata aceitação, visto que já era de circulação mundial devido à vasta extensão de territórios dominados pela Espanha.
Após várias proibições e seguidas liberações, chegou a suplantar o numerário português, sendo até em Portugal admitida, sob a denominação de "PATACAS".
Relação entre as moedas portuguesas e espanholas
Abaixo segue uma relação ou equivalência de valores entre as moedas portuguesas e espanholas anterior à carimbagem de 1643.
Moeda espanhola | Moeda portuguesa |
---|---|
8 Reales | 320 Réis |
4 Reales | 160 Réis |
2 Reales | 80 Réis |
1 Real | 40 Réis |
½ Real | 20 Réis |
Moedas obisidionais holandesas
No início do Séc. XVII, tanto a Holanda como Portugal e conseqüentemente o Brasil estavam subjugados à Espanha, maior potência da época.
Para os holandeses, portanto, a invasão e tomada de territórios na América do Sul fazia parte da resistência ao domínio espanhol, sendo criada com esse principal objetivo a GWC.
A GWC, financiada com o capital de 5 entidades e de particulares tinha seu contingente composto por holandeses e mercenários de diversos países, principalmente do norte da Europa e até espanhóis, que não lutavam por um ideal, mas pelo soldo pago pela Companhia, cujas receitas eram oriundas do saque às frotas espanholas, cultivo da cana de açúcar, exploração do pau Brasil e do ouro da Guiné, possessão holandesa na África.
A vinda do Conde Maurício de Nassau em 1637 e sua brilhante administração, até 1644 marcaram o apogeu do domínio holandês no nordeste brasileiro, com sua iniciativas nas áreas artísticas, culturais e urbanísticas.
Após inúmeros desentendimentos com o Conselho dos XIX, regressou à Holanda e devido a isso e a vários outros fatores, iniciaram-se as insurreições dos luso-brasileiros contra os Holandeses.
Seguiram-se confrontos e batalhas, até que estando a GWC sitiada no Recife e sem dinheiro para o pagamento das tropas, viu-se obrigada a desviar parte do ouro do carregamento que seguiria para a Holanda e cunhar o soldo para o pagamento de seus mercenários e compra de víveres.
Apesar de não emitidas oficialmente e sim numa situação de emergência; e não pela autoridade monetária (que nem existia) e sim pelos invasores sitiados, essas moedas simbolizam o início da história numismática de nosso país, por terem sido as primeiras cunhadas em solo brasileiro e por mostrarem o nome Brasil.
Hoje em dia essas moedas são raríssimas, chegando a pouco mais de uma centena os exemplares conhecidos. Sua escassez se dá aos seguintes fatores:
- Foram cunhadas com o peso propositadamente abaixo do padrão, para serem usadas provisoriamente, de modo que ao regressar à Holanda, os que as detinham trocaram por emissões regulares;
- Quando aceitas por algum luso-brasileiro, eram imediatamente derretidas, pois a simples posse das mesmas caracterizava crime de alta traição por colaboração com o invasor, punido com a morte.
Por ocasião de sua retirada, os holandeses também cunharam moedas de prata, nos valores de X, XII, XX e XXXX Stuivers, porém unifaciais e sem o nome Brasil.
Vale lembrar que nos territórios ocupados circulavam também moedas holandesas.
Carimbos coroados
O constante esforço de guerra de Portugal, contra a Espanha em seu território e contra os holandeses em suas colônias ocasionou grandes gastos à coroa, tornando-se necessário o levantamento do valor das moedas em circulação por meio de carimbagens.
Esses carimbos foram aplicados simultaneamente no Brasil e em Portugal, sendo nessa apresentação, descritos somente os aplicados no Brasil.
Essa carimbagem caracteriza a única atividade emissora de numerário no Brasil nos reinados de D. João IV (1640 a 1656) e D. Afonso VI (1656 a 1667).
Os carimbos foram aplicados sobre moedas Hispano- Americanas com base nos Alvarás/ Leis de: 26/02/1643; 1652; 06/07/ 1663 e 23/03/1679. Aplicação sobre moedas portuguesas: 22/03/1663.
Carimbos sobre moedas de ouro: Pelo Alvará de 12/04/1668 Foram aplicados carimbos elevando os valores das moedas de ouro de 1000, 2000 e 4000 em 10%.
Instalação da Casa da Moeda do Brasil
Numa tentativa de solucionar o total caos monetário existente, após freqüentes aumentos e rebaixamentos nos valores das moedas, remarcações, proibições, recolhimentos, fundições, o que causou grande dificuldade de pagamentos e inibiu o comércio, situação agravada ainda pela absoluta carência de numerário foi criada em 1694 a Casa da Moeda no Brasil, no reinado de D. Pedro II de Portugal (1683-1706).
Em 1695 iniciou-se oficialmente a cunhagem no Brasil com o chamado Padrão Fraco, ou seja, para um mesmo peso de metal, um maior valor nas moedas coloniais em relação às metropolitanas
Foram cunhados os valores de 20, 40, 80, 160, 320 e 640 Réis em prata.
Em ouro foram cunhadas moedas nos valores de 1000, 2000 e 4000 Réis.
Um detalhe interessante quanto à cunhagem da prata é que o metal do qual foram feitas as moedas era oriundo do derretimento de moedas antigas, já que não havia refino da prata na colônia.
A Casa da Moeda da Bahia funcionou de 1695 a 1698 quando foi transferida para o Rio de Janeiro, onde funcionou de 1698 a 1700, cunhando rigorosamente os mesmos valores.
Em 1700 foi transferida para Pernambuco, lá funcionando até 1702, seguindo o mesmo padrão de cunhagem. Em Pernambuco foram cunhadas as primeiras moedas com a Letra Monetária, um "P" sobre o Zodíaco, na Esfera Armilar. Terminados os trabalhos em Pernambuco, voltou ao Rio de Janeiro, onde só cunhou a "moeda forte", de ouro na razão de 1600 Réis a oitava.
Relativamente à mudança de localização da Casa da Moeda em seus primeiros 7 anos de existência, é interessante deixar bem claro que a casa sempre foi mesma, só que itinerante, já que transferir o maquinário é mais fácil e menos arriscado do que efetuar o transporte de valores.
Com o incremento do comércio após a entrada em circulação da moeda colonial de prata e de ouro, fez-se necessária uma maior quantidade de moeda miúda para troco, já que a moeda de cobre que existia na circulação até 1704 consistia em antigas moedas de cobre portuguesas, há muito insuficientes para satisfazer a demanda.
Nos anos de 1693 a 1699, a Casa da Moeda do Porto cunhou moedas nos valores de V, X e XX Réis para circularem em Angola, já com os pesos reduzidos (Padrão Fraco).
Com o passar do tempo essas moedas mostraram-se excedentes para a circulação na colônia africana de modo que a coroa ordenou a remessa das peças de X e XX Réis para a circulação no Brasil.
O período áureo da numismática colonial
O reinado de D. João V marcou o apogeu da numismática brasileira, pela diversidade, riqueza e beleza das moedas cunhadas, especificamente da cunhagem em ouro.
Foi criado o novo padrão de 12.800 Réis, dos Escudos, as primeiras moedas brasileiras a mostrarem a efígie do rei, cunhadas nas Casas da Moeda da Bahia, Rio e Minas Gerais, esta última recém aberta.
Com o auge do ciclo do ouro em Minas, deu-se a cunhagem da série de dobrões, nos valores de 400, 1.000, 2.000, 4.000, 10.000 e 20.000 Réis, essa última com peso de 53,78g, uma das maiores moedas de ouro já circuladas no mundo.
A emissão de moedas de prata foi incipiente. Na Casa da Moeda do Rio de Janeiro, foram cunhadas moedas de 160, 320 e 640 Réis, de 1748 a 1750 e em Lisboa, no ano de 1749, foi cunhada uma série de 80, 160, 320 e 640 Réis para circulação no Maranhão e Grão Pará.
Também são dessa série as moedas de ouro de 1.000, 2.000 e 4.000 Réis e as de cobre, nos valores de V, X e XX, todas de 1749 e sem letra monetária. Por serem iguais às do padrão monetário corrente, sua circulação estendeu-se a todo o território brasileiro.
Em cobre foram cunhadas moedas de X e XX Réis, a partir de 1715 na Casa da Moeda de Lisboa e a partir de 1729 na Casa da Moeda da Bahia, todas com peso reduzido.
Uma série curiosa circulada no reinado de D. João V foi a de moedas de XX e XL Réis, com o peso ainda inferior em 50% ao Padrão Fraco, mandada circular em Minas com a irônica legenda informando que para o uso, o cobre é mais adequado do que o ouro. Essa foi a resposta às reclamações da colônia de que o reino absorvia todo o ouro sem deixar espécie para giro.
Reinado de D. José I
No reinado de D. José, seguiu-se o padrão de cunhagem de D. João V:
Ouro: Casa de Lisboa cunhava no padrão fraco para circular na colônia e nas casas do Rio e da Bahia cunhava-se o padrão forte, para circular em Portugal.
A Casa da Moeda de Vila Rica já estava com suas atividades encerradas desde 1735.
O declínio do ciclo do ouro na colônia fica evidenciado, com a extinção do facial de 12.800 Réis.
Em prata, segue a cunhagem das moedas de 80, 160, 320 e 640 Réis no Rio e também na Casa da Moeda da Bahia, porém sem o valor de 80 Réis.
Na cunhagem do cobre, destacam-se as peças de X e XX Réis da Casa da Moeda do Rio de Janeiro, sem letra monetária, em cuja cunhagem foram usados cunhos abertos no Brasil e discos portugueses, que seriam utilizados nas moedas de 5 e 10 Réis.
Na Bahia foram cunhadas moedas nos valores de X, XX e XL Réis, nos anos de 1761 e 1762.
A particularidade dessas moedas é de serem as únicas moedas de cobre coloniais serrilhadas. Outra curiosidade é a variedade de coroa das moedas de XL Réis, com 3 tipos diferentes.
Outro detalhe interessante consiste nas moedas de cobre cunhadas em Lisboa para circulação na Guiné que por algum engano na hora do embarque, vieram parar no Brasil, onde circularam por serem também do padrão fraco.
Sem dúvida, a parte mais importante da numismática do período de D. José é a conhecida "Série J".
A finalidade dessa emissão era facilitar o troco do ouro em pó, na região das Minas Gerais, já que o valor das moedas era o exato equivalente ao peso da oitava de ouro em pó, medida usada na época:
Uma oitava de ouro (3.59 g) → 1200 réis
Para que essas moedas não se confundissem com as demais em circulação, já que as dimensões eram muito parecidas, ao invés do escudo das armas portuguesas, aparece a inicial do rei, "J", abaixo da coroa.
Maria I e Pedro III (1777 - 1786) e Maria I (1786-1799)
Para a numismática brasileira, esse foi um período sem grandes novidades nem alterações. Foram mantidos todos os padrões anteriores, a cunhagem do cobre foi exclusivamente feita em Lisboa e a de prata só começou a ser feita no Rio em 1791 (foram cunhados os valores de 320 e 640 Réis) e na Bahia em 1799 (somente 640 Réis).
No ouro, foi absolutamente idêntica à cunhagem de seu antecessor.
Em 1789 houve uma emissão de moedas da série "J" usando os cunhos de 1774-R.
Se por um lado não houveram inovações na emissão desse período, por outro lado as moedas cunhadas tiveram interessantes variações entre elas.
É o caso das três fases da vida da rainha, retratadas nas moedas de ouro:
1777-1786: ao lado do Rei, D. Pedro III
1787-1790: Véu de viúva
1790-1805: Toucado
Entre as moedas de prata e cobre cunhadas em Lisboa, a principal distinção está na coroa, havendo as variedades Alta e Baixa.
Não são conhecidos os motivos dessa variação, mas o mais provável é que cada abridor tivesse sua "marca registrada" sob a forma do estilo da coroa.
Com a deterioração do estado de saúde da soberana, seu filho, D. João foi obrigado a assumir o controle do governo, ordenando a única alteração monetária ocorrida:
Na emissão das moedas de cobre foi determinada a quebra do padrão monetário, ou seja, nas emissões a partir de 1799 os valores de X, XX e XL Réis foram cunhados com a metade do peso anterior.
Cabe ressaltar que o valor de V Réis dessa série não é emissão dessa época, pois foi cunhado em 1881-82 a mando do rei D. Luis, numismata que queria "completar a série".
D. João Príncipe Regente
Exercendo o poder desde 1792 devido ao mau estado de saúde de sua mãe, o Príncipe Regente D. João somente começou a ter seu nome gravado nas moedas somente a partir de 1802, nas moedas de cobre de X, XX e XL Réis cunhadas em Lisboa para circulação no Brasil.
Nas Casas da Moeda do Rio e da Bahia foram cunhadas moedas de ouro nos valores de 4.000 e 6.400 Réis até o ano de 1805, ainda com o nome e efígie de Dna. Maria I.
Em prata, foi usado o nome da rainha no Rio até 1802 e na Bahia até 1805.
Houve cunhagem na Casa de Fundição de Minas Gerais, nos valores de 320, 640 e 960 Réis, entre os anos de 1810 a 1816. A cunhagem era feita sobre as moedas J de 300 e 600 Réis e sobre pesos Hispano-Americanos.
Os cunhos dessas moedas são mais rústicos e a cunhagem não era de grande qualidade, o que resultou em moedas muito toscas, com grande interferência da moeda base, porém muito interessantes.
Na Casa da Moeda do Rio de Janeiro também foram cunhadas moedas regionais, com os pesos ainda inferiores ao das moedas pós quebra do padrão monetário, para circulação em Mato Grosso e Goiás.
Numismaticamente falando, o fato mais importante desse período foi a vinda da família real para o Brasil, fugindo das tropas de Napoleão.
A chegada da corte no Rio de Janeiro, não disposta a abrir mão das mordomias que restaram e o aparato administrativo com todo seu custo de manutenção elevaram de maneira formidável os gastos da coroa, fazendo com que se lançasse mão do mais tradicional recurso usado pelos nossos colonizadores para o aumento do numerário: o levantamento do valor das moedas circulantes.
Nas moedas de prata da série "J", foi aplicado o carimbo de "Escudete" de modo a aumentar o valor de 75 para 80, de 150 para 160, de 300 para 320 e de 600 para 640 Réis.
Nas moedas de cobre de emissão anterior a 1799 de X, XX e XL Réis os carimbos foram aplicados de forma a dobrar o seu valor circulatório, passando a valer, respectivamente, 20, 40 e 80 Réis.
Outra forma de gerar recursos para a coroa foi a criação do Carimbo Minas, pelo Alvará de 01/09/1808.
Havendo a circulação dos pesos Hispano-Americanos pelo valor de 750 a 800 Réis, determinou-se a aplicação nos mesmos de uma contramarca bifacial, que aumentava seu valor para 960 Réis, trazendo um ganho de 160 a 210 Réis para a coroa por moeda.
Essa carimbagem foi a precursora do PATACÃO cunhado no período colonial de 1809 a 1818 na Casa da Moeda do Rio e de 1810 a 1816 na Bahia.
Sendo moeda das mais apreciadas da nossa numismática, tanto aqui quanto no exterior, o Patacão possibilita uma ampla variedade de modalidades de coleção, desde por tipo, por variante, recunho e até variante de recunho.
Moeda de prata de 26,8 gramas de padrão internacional, igual às moedas de 1 Thaler dos Estados Germânicos, 1 Dollar dos EUA, 5 Francos da França, 1 Coroa da Grã-Bretanha e obviamente 8 Reales da Espanha, o Patacão teve sua circulação extendida a outros países, principalmente outras colônias portuguesas, devidamente carimbado.
Autorização de publicação
Esse artigo foi retirado do Boletim nº 54 da Sociedade Numismática Brasileira, originalmente publicado/apresentado pelo Sr. Walter de Arruda Menezes no I Congresso Latino Americano de Numismática que aconteceu nos dias 26 a 30 de novembro de 2003.
A publicação do mesmo no Blog do Collectprime foi autorizada pela SNB, na pessoa do Presidente Gilberto Tenor no dia 11/08/2018.