Caso Murtinho e a cédula de 2 mil Réis

Nascido em 1848 na província do Mato Grosso, Joaquim Duarte Murtinho seguiu, aos 12 anos, para a capital do Império, o Rio de Janeiro. Lá ele se empenhou em seus estudos e se tornou um dos mais disputados médicos homeopatas da época. Foi um dos homens mais ricos e influentes, celibatário fervoroso, nunca constituiu família.

Com o nascimento da República, Murtinho entrou para a política, foi Senador entre 1890-1896, 1903-1906 e 1907 a 1911 e Ministro da Fazenda de Campos Salles entre 1898-1902. E conquistou muitos inimigos.

A nova cédula

Ao que se sabe, o então Senador Murtinho, entre 1890 e 92, pediu a um jornalista que fizesse a busca de uma jovem mulher para que representasse a República na nova cédula que viria a substituir a de circulação da época.

A moça foi apresentada pelo jornalista e em seguida partiram para o Rio de Janeiro e, de lá, com Joaquim Murtinho, foram para a Europa.

Lá, o pintor Conrad Kiesel desenhou alguns quadros usando como base a modelo, e destes, dois ganharam destaque: "Dolores" e "Saudade". As pinturas seguiram, por intermédio de Murtinho, para a American Bank Note Co. (ABNCo), onde a empresa encarregou o gravador japonês Sukeichi Oyama (1858-1922), então funcionário da lendária empresa norte-americana American Bank Note Co. (ABNCo), para efetuar as gravuras.

Com base nas pinturas, Sukeichi desenvolveu "Zella" em 1893 a partir do quadro "Saudade" e, no ano posterior, "Mima" a partir do quadro "Dolores" de Conrad Kiesel. Em 1900, no Brasil, a gravura Zella foi utilizada nas novas cédulas de 2000 Réis (R082 - Thesouro Nacional - 9a Estampa).

Sukeichi Oyama ainda produziu ainda uma gravura de "Reverie" uma outra mulher estampada na obra "The Three Fates" de Paul Thumann.

Gravuras de Sukeichi Oyama: de Reverie (a esquerda - a partir do quadro 'The Three Fates' de Paul Thumann), Mima (ao centro - partir do quadro 'Dolores' de Conrad Kiesel) e Zella (à direita - a partir do quadro 'Saudade' de Conrad Kiesel)

Em 1900, o então ministro da Fazenda Joaquim Murtinho foi acusado de usar a imagem de uma meretriz nas cédulas da República.

Diziam que a mulher era amante do ministro, que sofreu diversos ataques. Até mesmo Rui Barbosa disse "ser autêntico o ignóbil corpo de delito" acrescentando não haver nada na efígie daquela mulher que não nomeasse uma rainha do mundo obsceno.

Na Câmara dos Deputados, o sergipano Fausto Cardoso disse:

"Porventura a linguagem de arrieiro é aquela em que disse que as notas do Thesouro trazem como símbolo da República retratos de meretrizes?".

O deputado chegou a mencionar o nome de uma "Sra. Prates" como sendo a dona de um bordel da Capital Federal: "uma nota em que figura uma das meretrizes mais conhecidas na Capital Federal: Sra. Prates." disse segurando a cédula na mão.

O Deputado Fausto Fragoso disse:

"Sr. Presidente, apesar de ter o espírito cansado e o corpo em ruínas, continuo a desempenhar-me do compromisso, que, na defesa dos interesses nacionais, tomei para comigo mesmo, de mostrar à luz da maior evidência que a doutrina e a conduta administrativa do Sr. Ministro da Fazenda são contrárias ao Direito, à Moral, às Leis, às grandes conveniências públicas."

Não há registros do nome da mulher que serviu de inspiração para os quadros de Conrad Keisel, ao que se sabe, "Sinhazinha" (nome pelo qual ficou conhecida) faleceu esquecida pouco tempo após retornar ao Brasil, devido a uma doença grave contraída em Portugal.