A misteriosa música dos 100 cruzeiros
Cadmo Fausto, o artista dos Cruzeiros (2ª parte) — A "Cultura Nacional"
Na primeira parte da série vimos um pouco sobre a vida e arte do homem que ficou conhecido no meio numismático por suas obras clássicas alusivas aos episódios da história do Brasil.
Entre elas, estão "Proclamação da República", "Abertura dos Portos", "Lei Áurea" e "Cultura Nacional". Todas utilizadas pela Caixa de Amortização para ilustrar os reversos de cédulas do cruzeiro emitidas entre 1943 e 1967.
Em nosso segundo episódio – desta vez também aqui na Collectprime — iniciaremos um maior aprofundamento nas alegorias criadas por Cadmo Fausto. Nossa saga trará em primeiro plano a cédula de 100 Cruzeiros / D. Pedro II e a Cultura Nacional.
FIQUE ATENTO - Em uma série de artigos, seguiremos a ordem decrescente de valor das cédulas de Cruzeiro que apresentam os trabalhos do artista.
100 cruzeiros
Esta nota de papel moeda, traz no anverso a efígie de D. Pedro II, relacionado com a alegoria da "Cultura Nacional" no reverso. Esta é uma das alegorias criadas sob encomenda para a cédula e seria, segundo informações da galeria de cédulas e moedas do Museu de Valores do Banco Central do Brasil, produzida por Cadmo Fausto de Souza.
Na efígie desta nota encontramos o último imperador do Brasil sendo retratado diferente de seu pai e de seu avô nas cédulas anteriores, com uma vestimenta simples sem ornamentações ou referências de distinção. Abaixo de seu retrato seu nome também acompanhado do título de Dom: "D. Pedro II".
Certamente não temos a foto que teria servido de base para a confecção da representação artística do Imperador. Entretanto, a imagem com maior semelhança foi escolhida, mas infelizmente sua autoria é desconhecida.
Nesta imagem podemos perceber o imperador com o mesmo posicionamento e detalhes muito parecidos em seus cabelos, barba e vestimenta. Claro que não se trata da mesma imagem, por isso serão encontradas algumas diferenças.
No reverso da cédula de 100 Cruzeiros, reproduzida acima, temos a alegoria denominada "Cultura nacional".
Ao ampliarmos a imagem é possível a visualização de detalhes retratados: em primeiro plano uma mulher segurando em uma mão um livro e na outra um ramo de louro apoiando-se sobre o globo terrestre que deixa entrever a imagem do continente americano, em sua volta ela está acompanhada por uma palheta de pintura, uma partitura, uma lira, uma luneta, um livro, alguns papéis enrolados, um busto e o pedaço de uma coluna grega.
Todos os elementos relacionam o imperador diretamente com atividades eruditas, deixando de lado a imagem de um monarca que travou uma guerra com os países vizinhos e que foi deposto, mas transmitindo a imagem de um governante sábio.
Ao voltarmos brevemente nossos olhos para as composições desta alegoria, iremos perceber que a mesma sofreu discretas alterações desde sua primeira aparição pública em 1943, quando ainda era impressa pela American Bank Note Company em sua primeira estampa, onde também apresentava tom azulado. A cédula circulou com autógrafos e chancelas.
Uma segunda estampa circularia em 1949 com as discretas alterações e impressas pela Thomas De La Rue e Company, Limited, London. A cédula apresentava tom avermelhado, e circulou com autógrafos e chancelas.
A diferença ente as duas impressões
Na impressão do anverso da TLR, notamos maior requinte nos detalhes em arabescos e um reposicionamento da identificação da efígie do homenageado dando mais fluência e harmonia para a composição, as rosáceas identificadas nos quatro cantos da cédula que trazem o valor de face da nota também sofreram alterações valorizando novamente a fluidez e a harmonia. A mesma atenção aos detalhes foi dada ao valor facial que é percebido ladeando a efígie.
No reverso percebemos uma menor gama de modificações, mas o pouco se transforma em muito pela intensidade e significância das alterações propostas. Iremos iniciar pelo básico, onde foram posicionadas de forma contraria na impressão da TLR em relação a impressão da ABN, o título da obra do artista.
Sendo transferido da esquerda para a direita na segunda estampa, também podem ser notadas as alterações na vegetação e paisagens que compõem o fundo, os ramos segurados pela representação feminina são mais detalhados e compridos, o globo terrestre também é mais preciso em sua representação das porções continentais apresentadas.
O busto da representação feminina representa uma das maiores alterações da composição, sendo completamente diferente da apresentada na cédula de 1943.
A música dos 100 cruzeiros
É preciso destacar a maior diferença entre as duas impressões, esta, seria a partitura posicionada entre a arpa e a luneta. Na composição impressa pela ABN em 1943 a partitura apresenta linhas alusivas, mas sem qualquer representação de notas musicais identificadas com aparelhos de aproximação.
Já na composição impressa pela TLR, a partitura apresenta notas musicais que sugerem uma melodia. Nesta imagem é possível perceber as notas musicais;
É possível arranjar as notas, deduzindo um determinado tempo musical para a formatação do que seria a representação real da partitura da composição alegórica.
Neste vídeo oferecemos ao leitor a possibilidade de ouvir a musica pela primeira vez desde 1949.
Não foram encontrados relatos sobre a música e sua autoria, mas deduzimos pelas diferenças alegóricas entre as duas casas impressoras, que Cadmo Fausto adicionou maior requinte de detalhes na segunda estampa, a partitura seria a mais emblemática alteração de todas. Certamente um tipo de "easter egg" da época e que ficou adormecido até a atualidade.
É preciso batizar a música para que esta seja lembrada e celebrada no meio numismático e notafilico, também é preciso celebrar esse detalhe no campo da história, para tal, devemos considerar o nome "Cultura Nacional" como sendo a mais justa representação desta peça que salta ao papel e se coloca de forma bela e erudita diante de nós. É a representação viva desta alegoria tão icônica.
Fontes:
- O DINHEIRO DO BRASIL – Banco Central do Brasil.
- RAMOS, Marina Contin – Com Vargas no bolso: O meio circulante brasileiro como ideologia e propaganda do Estado Novo. 2015
Pesquisadores envolvidos
- Bruno Diniz, Historiador, Cientista Político, numismata e notafilista.
- Cícero Marciano Cordeiro Neto, Estudante, Contribuiu para a Leitura da partitura e a composição dos tempos para o desenvolvimento da melodia.
- Diniz Numismática – www.diniznumismatica.com