A misteriosa música dos 100 cruzeiros

Cadmo Fausto, o artista dos Cruzeiros (2ª parte) — A "Cultura Nacional"

Na primeira parte da série vimos um pouco sobre a vida e arte do homem que ficou conhecido no meio numismático por suas obras clássicas alusivas aos episódios da história do Brasil.

CADMO FAUSTO, O ARTISTA DOS CRUZEIROS (1ª parte) - Surge um grande talento.
Cadmo Fausto de Sousa ou simplesmente Cadmo Fausto, nasceu e viveu no Rio de Janeiro, de 1901 a 1983. Foi pintor, desenhista e professor b...

Entre elas, estão "Proclamação da República", "Abertura dos Portos", "Lei Áurea" e "Cultura Nacional". Todas utilizadas pela Caixa de Amortização para ilustrar os reversos de cédulas do cruzeiro emitidas entre 1943 e 1967.

Em nosso segundo episódio – desta vez também aqui na Collectprime — iniciaremos um maior aprofundamento nas alegorias criadas por Cadmo Fausto. Nossa saga trará em primeiro plano a cédula de 100 Cruzeiros / D. Pedro II e a Cultura Nacional.

FIQUE ATENTO - Em uma série de artigos, seguiremos a ordem decrescente de valor das cédulas de Cruzeiro que apresentam os trabalhos do artista.

100 cruzeiros

Esta nota de papel moeda, traz no anverso a efígie de D. Pedro II, relacionado com a alegoria da "Cultura Nacional" no reverso. Esta é uma das alegorias criadas sob encomenda para a cédula e seria, segundo informações da galeria de cédulas e moedas do Museu de Valores do Banco Central do Brasil, produzida por Cadmo Fausto de Souza.

Cédula de cem cruzeiros (American Bank Note Company). Anverso com D. Pedro II e reverso com alegoria da "Cultura Nacional" - Acervo Bruno Diniz

Na efígie desta nota encontramos o último imperador do Brasil sendo retratado diferente de seu pai e de seu avô nas cédulas anteriores, com uma vestimenta simples sem ornamentações ou referências de distinção. Abaixo de seu retrato seu nome também acompanhado do título de Dom: "D. Pedro II".

Certamente não temos a foto que teria servido de base para a confecção da representação artística do Imperador. Entretanto, a imagem com maior semelhança foi escolhida, mas infelizmente sua autoria é desconhecida.

Nesta imagem podemos perceber o imperador com o mesmo posicionamento e detalhes muito parecidos em seus cabelos, barba e vestimenta. Claro que não se trata da mesma imagem, por isso serão encontradas algumas diferenças.

No reverso da cédula de 100 Cruzeiros, reproduzida acima, temos a alegoria denominada "Cultura nacional".

Ao ampliarmos a imagem é possível a visualização de detalhes retratados: em primeiro plano uma mulher segurando em uma mão um livro e na outra um ramo de louro apoiando-se sobre o globo terrestre que deixa entrever a imagem do continente americano, em sua volta ela está acompanhada por uma palheta de pintura, uma partitura, uma lira, uma luneta, um livro, alguns papéis enrolados, um busto e o pedaço de uma coluna grega.

Todos os elementos relacionam o imperador diretamente com atividades eruditas, deixando de lado a imagem de um monarca que travou uma guerra com os países vizinhos e que foi deposto, mas transmitindo a imagem de um governante sábio.

Ao voltarmos brevemente nossos olhos para as composições desta alegoria, iremos perceber que a mesma sofreu discretas alterações desde sua primeira aparição pública em 1943, quando ainda era impressa pela American Bank Note Company em sua primeira estampa, onde também apresentava tom azulado. A cédula circulou com autógrafos e chancelas.

Cédula de cem cruzeiros (Thomas de la Rue & Company Limited London). Anverso com D. Pedro II e reverso com alegoria da "Cultura Nacional" - Acervo Bruno Diniz

Uma segunda estampa circularia em 1949 com as discretas alterações e impressas pela Thomas De La Rue e Company, Limited, London. A cédula apresentava tom avermelhado, e circulou com autógrafos e chancelas.

A diferença ente as duas impressões

Na impressão do anverso da TLR, notamos maior requinte nos detalhes em arabescos e um reposicionamento da identificação da efígie do homenageado dando mais fluência e harmonia para a composição, as rosáceas identificadas nos quatro cantos da cédula que trazem o valor de face da nota também sofreram alterações valorizando novamente a fluidez e a harmonia. A mesma atenção aos detalhes foi dada ao valor facial que é percebido ladeando a efígie.

No reverso percebemos uma menor gama de modificações, mas o pouco se transforma em muito pela intensidade e significância das alterações propostas. Iremos iniciar pelo básico, onde foram posicionadas de forma contraria na impressão da TLR em relação a impressão da ABN, o título da obra do artista.

Sendo transferido da esquerda para a direita na segunda estampa, também podem ser notadas as alterações na vegetação e paisagens que compõem o fundo, os ramos segurados pela representação feminina são mais detalhados e compridos, o globo terrestre também é mais preciso em sua representação das porções continentais apresentadas.

O busto da representação feminina representa uma das maiores alterações da composição, sendo completamente diferente da apresentada na cédula de 1943.

A música dos 100 cruzeiros

É preciso destacar a maior diferença entre as duas impressões, esta, seria a partitura posicionada entre a arpa e a luneta. Na composição impressa pela ABN em 1943 a partitura apresenta linhas alusivas, mas sem qualquer representação de notas musicais identificadas com aparelhos de aproximação.

Já na composição impressa pela TLR, a partitura apresenta notas musicais que sugerem uma melodia. Nesta imagem é possível perceber as notas musicais;

É possível arranjar as notas, deduzindo um determinado tempo musical para a formatação do que seria a representação real da partitura da composição alegórica.

Neste vídeo oferecemos ao leitor a possibilidade de ouvir a musica pela primeira vez desde 1949.

Não foram encontrados relatos sobre a música e sua autoria, mas deduzimos pelas diferenças alegóricas entre as duas casas impressoras, que Cadmo Fausto adicionou maior requinte de detalhes na segunda estampa, a partitura seria a mais emblemática alteração de todas. Certamente um tipo de "easter egg" da época e que ficou adormecido até a atualidade.

É preciso batizar a música para que esta seja lembrada e celebrada no meio numismático e notafilico, também é preciso celebrar esse detalhe no campo da história, para tal, devemos considerar o nome "Cultura Nacional" como sendo a mais justa representação desta peça que salta ao papel e se coloca de forma bela e erudita diante de nós. É a representação viva desta alegoria tão icônica.

Fontes:
- O DINHEIRO DO BRASIL – Banco Central do Brasil.
- RAMOS, Marina Contin – Com Vargas no bolso: O meio circulante brasileiro como ideologia e propaganda do Estado Novo. 2015

Pesquisadores envolvidos
- Bruno Diniz, Historiador, Cientista Político, numismata e notafilista.
- Cícero Marciano Cordeiro Neto, Estudante, Contribuiu para a Leitura da partitura e a composição dos tempos para o desenvolvimento da melodia.
- Diniz Numismática – www.diniznumismatica.com